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quinta-feira, junho 21, 2012

O Marqueteiro e o Treinador



Se há duas profissões onde a comparação, por analogia, facilita o entendimento de uma e de outra, elas são a de marqueteiro – ou consultor de marketing político-eleitoral – e a de treinador de futebol.

Já notaram que cada treinador tem seu grupo de profissionais, que leva a todos os times que o contratam? São, basicamente, o auxiliar técnico, o preparador físico e o treinador de goleiros.

Com o marqueteiro também é assim. Para onde ele vai, sempre leva sua produtora preferida, seu redator, produtor, diretor, apresentadores, repórteres, locutores...

Ultimamente, novos profissionais têm se juntado a esse grupo. No futebol, é cada vez mais comum os treinadores contarem com fisiologistas, nutricionistas, psicólogos, fisioterapeutas e outros especialistas da área médica e comportamental.

Na equipe do marqueteiro passam a ter lugar garantido o estatístico, o diretor de arte, o analista de mídias sociais, o produtor de eventos e até profissionais que antes eram contratados diretamente pelo partido ou coligação, como a assessoria jurídica e de contabilidade, importantíssimas para os casos em que o campeonato se decide no tapetão.

Há os treinadores mais ousados, cujos times jogam sempre no ataque, e os famosos retranqueiros. Os marqueteiros também têm seus traços característicos. Há os que privilegiam a estética imagética, outros jogam todas as suas cartas na qualidade dos textos. Uns são mais racionais e fazem dos programas de seus candidatos verdadeiros programas jornalísticos. Outros optam pela linha mais emocional. Pouca informação e muita música, depoimentos inflamados, cenas de demonstração de afeto do eleitor para com o candidato e vice-versa.

Treinadores e Marqueteiros tem seus estilos. Os times que treinam e as campanhas que produzem são sempre parecidos. É como se fosse a sua fórmula particular do sucesso, que sofre alterações caso a caso, mas mantém sempre a mesma espinha dorsal. Isso fica muito marcante quando um consultor de marketing trabalha com várias campanhas ao mesmo tempo, em lugares diferentes. São sempre muito parecidas, o que demonstra que a cara da campanha quase nunca é definida pelo candidato e sim pelo marqueteiro, que apenas enquadra a candidatura em um conceito pré-definido não apenas por seu conhecimento técnico e experiência profissional, mas, principalmente, pelo cenário do momento e pelas tendências da comunicação e da percepção do eleitor.

Já tivemos eleições onde todas as campanhas falavam em emprego. Outras onde o foco era saúde. Combate à violência, moradia, infra-estrutura e outros temas também foram abordados em campanhas passadas.

Temas que vão ser muito utilizados nas próximas eleições, nas médias e grandes cidades, por exemplo, são mobilidade urbana, sustentabilidade e empregabilidade, que não tinham grande destaque em campanhas passadas. Esses temas são como as formações táticas do futebol. 4-4-2, 3-4-3 etc. Assim como no futebol as formações se dão sempre em torno da defesa, meio-campo e ataque, na campanha os temas vão sempre girar em torno da qualidade de vida,  formação profissional, economia e lazer, que se traduzem em mantras como educação, saúde, segurança, emprego e renda, moradia, abastecimento d´água, saneamento, urbanização e cultura. As formações mudam, mas os espaços são sempre os mesmos e apesar da vontade que todo treinador/marqueteiro sempre tem de inovar, experiências passadas mostram que campanhas baseadas em temas que não interessam à grande maioria do eleitorado naquele momento não se sustentam e nem sustentam uma candidatura, assim como não dá pra tentar entrar em campo com um 1-2-3-4.

No entorno da campanha, como do time de futebol, forças ocultas agem o tempo todo. No futebol, são dirigentes, empresários, patrocinadores, representantes de torcidas e a mídia. Na eleição, são os dirigentes partidários, os líderes políticos, os apoiadores mais importantes, a mídia e os assessores próximos ao(s) candidato(s), que sempre acreditam entender muito de marketing e comunicação, assim como os do time acreditam entender muito de futebol, e sempre têm uma dica genial para oferecer gratuitamente ao consultor ou ao treinador. O problema é que sempre ficam de cara amarrada, chegando a ameaçar abandonar o time – ou o candidato – quando o pitaco não é aceito, já que seria ele, por mais idiota que fosse, o grande responsável pela esmagadora vitória.

Por vezes, até são pertinentes as observações desses curiosos, mas dificilmente vêm prontas para usar ou no momento certo. Quase sempre precisam de profundas mudanças conceituais ou de timming, para que sejam usadas no momento certo, o que provoca ainda mais ira em seus “criadores”. Na maioria das vezes o que acontece mesmo é que tais ações estão previstas no planejamento da campanha, ou do campeonato, e o que o pitaqueiro faz é apenas antevê-la. Nesses casos é sempre complicado lidar com a situação. O cara chega pra você e diz “se eu fosse você, eu fazia isso, isso e isso”. Aí você diz que aquilo já está nos seus planos e você irá utilizar na hora certa. E ele sempre acredita que você não tinha nem ideia daquilo e aproveitou a oportunidade para “chupar” a ideia genial dele. No final, se você usa, copiou dele. Se não usa é um idiota orgulhoso, que não aceita opinião de ninguém e está prejudicando seriamente o candidato com essa postura.

O candidato é outro elemento complicado de lidar. Ele é o equivalente àquela estrela do time de futebol, sempre cercado por um monte de babões, travestidos de amigos, colaboradores, assessores etc., sempre querendo provar sua extrema influência sobre a estrela da campanha ou do campeonato.

Você pede para o candidato ficar tranquilo no debate, o babão manda ele “botar pra lascar” em cima do opositor. Você sugere uma mudança de postura, ele diz que o candidato tem é que ser daquele jeito mesmo, pois foi aquele “jeitão” que o tornou tão bem sucedido nas eleições anteriores.

É difícil encontrar um candidato – como é difícil encontrar uma grande estrela do futebol – que de fato se disponha a colaborar integralmente com a campanha – ou campeonato.

Do mesmo jeito que os “bad boys” do futebol por vezes atrapalham o andamento da equipe com seus comportamentos arredios, assim são alguns candidatos.

Tem o candidato Romário, que não gosta de treinar e sempre prefere enfrentar debates, eventos e entrevistas com a cara e a coragem, crente que é o melhor orador do mundo e entende tudo sobre todos os assuntos.

Tem o candidato Renato Gaúcho, que vê a campanha como uma grande oportunidade para “pegar mulher” e sai dando em cima de todo mundo, de seguradora de bandeira à esposa do opositor.

Tem o candidato Cristiano Ronaldo, que acha que sendo o bonitão da campanha não precisa de mais nada. Apenas um sorriso conquistará qualquer eleitor.

Mas esses são os exemplos dos candidatos que se identificam com estrelas do futebol que deram certo. A maioria mesmo se identifica é com aqueles que tiveram essas posturas e se deram mal.

Para um Romário que deu certo, quantos preguiçosos e farristas deram errado?

A realidade é que o candidato é apenas mais um funcionário da campanha e, como tal, deve cumprir rigorosamente sua função no projeto, que, basicamente, é sempre a mesma: encontrar o maior número de pessoas possível e conquistar o máximo de votos.

Todo político é levado pelas circunstâncias a achar que é superdotado do ponto de vista da inteligência, persuasão e capacidade de superação. Poucos são. A maioria é convencida disso por um cordão de puxa-sacos que depende do ego inflado do chefe para se dar bem dentro do esquema.

Em síntese, o marqueteiro, como o treinador, é um grande malabarista, daqueles que equilibra pratos girando sobre varas enquanto um palhaço tenta distraí-lo. Tem que estar sempre focado no seu objetivo final, mas, ao mesmo tempo, extremamente atento ao que acontece à sua volta.

Tem que entender de estratégia, mas também tem que ter na manga as táticas certas para cada oportunidade ou ameaça.

E assim como o treinador de futebol, é julgado não apenas pelos resultados, mas também pela forma como interage com todo o meio ao longo de seu trabalho. Cada vez mais o mercado aceita menos as estrelas intratáveis, os gênios incompreendidos e os artistas que baseiam todo o seu trabalho no super estimado feeling.

O tempo é da técnica, dos números, da análise sintética e analítica do micro e do macro ambiente. Do conhecimento profundo do cenário, da própria equipe e do opositor. Do time formado por especialistas, cada um mais competente em sua área do que o próprio chefe.

Às vezes é preciso sacrificar um defensor para não sofrer um gol.

Às vezes é preciso usar os reservas.

Às vezes é preciso jogar com o regulamento debaixo do braço. 

Quase sempre, do pescoço pra baixo é tudo canela e, em caso de dúvida, bola pro mato, que é final de campeonato.

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